Minha bisavó tem Alzheimer. Já faz alguns anos que a doença começou a se manifestar e no momento ela se encontra em um estado que não consegue nem mais falar. Ela não lembra de nada, não interage mais. Ela não se manifesta. Mas o que mais me impressiona nessa doença é a ausência presente em seus olhos. São vazios, opacos, sem vida. Como se não existisse mais alma dentro de um corpo oco. Imagino a mente do ser humano como um prédio enorme repleto de corredores. Nas paredes desses corredores, há quadros e fotografias. Essas imagens fazem parte da memória. O prédio da minha bisavó é cheio de corredores vazios. As paredes são brancas e desgastadas e a maior parte dos quadros foi roubada pelo Esquecimento. As imagens que sobraram não estão nítidas. Minha bisavó está perdida no meio de algum desses corredores, sem saber o que fazer. E essa é a doença que pecorre a alma dela.
Minha mãe acha que eu não sofro porque eu não costumo falar muito desse assunto. Minha família acha que eu não trato bem a minha bisavó, porque não falo muito com ela. E todos me acham uma ingrata por causa desse tipo de atitude. Mas eu moro longe (o que é uma sorte) e mesmo não expressando muito, eu também sofro. E eu não costumo falar com a minha bisavó, não por ingratidão, mas talvez por medo. Medo de olhar nos olhos vazios e ver que não existe mais nenhuma luz nele. Ela esqueceu quem eu sou, porém, eu tenho todas as lembranças boas da minha infância. Guardadas em uma caixa que eu só abro quando estou sozinha. E segura.
A perde de memória é o mais triste, pq é do conjunto de memórias que se reconhece a pessoa. Essa doença é terrível pra quem convive pq vc vê aquela pessoa que amava sumindo aos poucos.
ResponderExcluirE as pessoas sempre esperam que vc siga o protocolo e chore abertamente e mostra pra todos que está triste, sendo que os momentos mais sinceramente melancólicos são passados em algum lugar escondido.
E o que não é a sua bisavó senão as pinturas e retratos do corredor?
ResponderExcluirAo amar isto, guardado na sua caixa segura, vc demonstra que ama realmente o que foi a sua bisavó. Aquilo que ela é, e não aquilo que ela parece ser hoje.