sexta-feira, 12 de março de 2010

Na parada de ônibus

A brisa gelada soprando, a rua vazia, o asfalto escuro. Os pingos de chuva eram tão finos que mal se percebia que estava chovendo. Mas estava. Sempre estava. As gotas brilhavam na vegetação verde, obscurecida pela camada de nuvens que escondiam o sol. Ao longe, um vislumbre da montanha, coberta de neblina semelhantes a algodão doce tão inconsistente que derrete com o toque quente da mão. Assim como os relacionamentos passageiros dessa vida. Ouviam-se seus passos, enquanto caminhava em direção à escola. Usando meias até os joelhos, e uma saia bem no estilo colegial. A mochila pesada pendurada nas costas. Passava pelos postes como ao despedir-se da luz da vida. E parecia que seus momentos possuíam música própria. Ou então eram os fones que carregava nas orelhas: seus melhores amigos. Ia cantarolando uma canção dos Beatles, enquanto sua vida passava em um relâmpago. Os pingos ficavam mais grossos e o frio cortava sua face. Mas quem disse que ela se importava? Aqueles dias eram os melhores. Atravessava a rua, como quem passa sem dar importância. Às vezes os momentos mais importantes passam despercebidos e nós só percebemos quando atravessamos a rua. E então, só resta olhar para trás. Para as estradas vazias e o dia escuro. Esperava sempre na parada de ônibus por uma salvação, alguém que tirasse aquela maldita rotina de que tanto gostava. Ou se acostumara. É difícil distinguir, a linha que separa o Amor do Costume em algumas situações é muito tênue. E então, só restava esperar.  E dançar. Dançar para afastar o frio e a dor.  Para um lado e para o outro, como o pêndulo de um relógio que nunca deixa de funcionar. Como as vidas que se separam e se unem novamente em um novelo confuso de caminho. E era tanta a dor que só dançando e estalando os dedos daquele jeito, ela podia esquecer. Ou amenizar. Tudo depende de um ponto de vista, um ângulo de um polígono, um número, uma frase, uma mente desmedida. Naquela hora exata,  quase sete e quarenta e cinco, para ela era madrugada, ele surgia sempre com seus passos tranquilos irritantes. E aquele sorriso singelo como quem diz 'bom dia' silenciosamente. Ela parava, constrangida. Os raios de sol brigavam com as nuvens, e os dois pareciam assim opostos. Ele escutava a própria música, vivia no seu compasso. Sozinho. Balançava a cabeça como se estivesse envolvido, sem perceber o mundo em volta. Parecia que só existia ele e o ônibus que estava por vir. Já ela, observava todos os traços perfeitos que pareciam escultura, militramente projetados para serem centrímetos por centrímetros perfeitos, como um desenho repleto de linhas feitas com tal desenvoltura que Da Vinci teria inveja. Ela sentia que ele era solitário. Coitado, ali parado, sem receber nenhum telefonema. Ou então compadecia-se de sua própria solidão, pois desse jeito podia sentir a auto-piedade que tanto detestava sem se culpar. O pé dele mexia-se para cima e baixo conforme o ritmo da música que ele escutava. E tudo que ela queria era perguntar-lhe que música escutava. Entretanto, ele nunca notou essa ansiedade brutal que a aprisionava, tão concentrado que estava em seus sentidos. Porque às vezes a vida passa e nós só percebemos quando já estamos na parada de ônibus. Esperando.

2 comentários:

  1. tai uma das 10 coisas que eu mais odeio...esperar na parada de onibus!

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  2. A manha é comprar um carro, assim você faz as coisas sem ter que esperar pela boa vontade dos outros.

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